LIRA DE NOSSO PRESENTE PERDIDO


Em que pese a ironia, loucura, inconsequência e até mesmo meu conhecimento em música, mas eu gostaria de começar falando que a nossa geração perdeu uma oportunidade única de se igualar a geração de nossos pais e avós e por isso tornamos o governo Bolsonaro um pouco pior, mais forte do que sua capacidade, não produzimos além da morte do tempo nas redes sociais

Sim, eu sei, podem parecer muito duras essas palavras, mas quando falo em nossa geração, estou falando em nós, intelectuais, artistas, jornalistas, professores, professoras e a sociedade crítica em geral que nasceu depois de 1975, perdemos o trem da história em nome de um lacre, de uma cancelada e até mesmo de revisionismo estúpido de querer contextualizar o contexto histórico e politico dos anos 1960/70 como se fosse hoje.

Uma certeza e respeito eu tenho, naquela época a música brasileira chegou ao auge de sua criatividade, reinvento e também transgressão, porém os malditos ainda são malditos para nós, buscamos algo para repercutir e mostrar que estamos “na luta”, “eles venceram e o sinal está fechado para nós”, não é verdade?! A construção de um clássico nos dias atuais é muito difícil, afinal o consumo é segmentado, as rádios fazem essa divisão de uma maneira até para facilitar a invenção de ídolos, até porque Hollywood não produz mais cowboys.

A crise da canção está dada, o século XXI começou no oposto do século XX, onde a luz das ideias estavam acima do consumo, a chamada belle époque onde a música e as artes eram incentivadas, quando em 23 de outubro de 1906, no campo de Bagatelle, Paris,Santos Dumont fez um happening, perante mais de mil espectadores, sem falar no modernismo de 1922, passaram-se 100 anos e a sociedade brasileira não produziu nenhuma ruptura ou proposta diferente, nova que pudesse colocar a cultura brasileira em um novo patamar.

Nossa geração vive a fase anal freudiana, precisamos superar esse sadismo, esse plutão em escorpião, essa necessidade de se satisfazer na dor alheia, agozes de nós mesmos, até mesmo o humor, para além da ruptura lógica se confunde com lacração ou ofensa, a politica imita a vida, a vida imita o recalque, a fase anal pode ser parafraseada pela “silaba tônica indefinida” de Anitta em relação aos Sertanejos, o máximo de transgressão que consequimos é aplaudir uma tatuagem que não temos coragem de fazer.

Digo tudo isso, pois em uma noite quente de inverno percebi que seríamos presas fáceis na mão dos censores, a abstração perdeu seu lugar na arte e na produção intelectual até mesmo para um público que poderia consumir, pois mesmo que de modo digital, combatemos o facismo que grassa por aí com uma mentalidade analógica pois compartilhamos memes de capas de disco de Chico Buarque, frases de camisetas de Belchior, Caetano chamando Geraldo Mairink de Burro, mas gostamos mesmo de nos abraçar e cantar Evidências, gostamos mesmo é do ruído e não do som em movimento, queremos o “Belo” como começo do terrível, gotas de sangue nas roupas de Lorca, é triste perceber isso, perceber que todos aqueles que poderiam mudar tudo isso, ainda ressoam o éco de um passado insistente em nos acordar como uma ressaca de manhã, imagina quando a gente perceber que a morte nos fala com uma voz silenciosa para não dizer nada e que todas as mortes foram em vão?!

Elian Woidello