Biografia lançada nos EUA resgata com detalhes a vida e a obra de um dos maiores e mais influentes músicos da história do rock’n roll
Nascido em Oklahoma no ano de 1941, Claude Russell Bridges tinha apenas 14 anos quando mentiu sua idade para poder tocar ao vivo numa boate em Tulsa, ao lado de Jerry Lee Lewis.
Para muita gente que vive e ouve rock hoje em dia, é difícil avaliar o tamanho de Leon Russell década e meia depois, no início dos anos 1970 nos Estados Unidos. Durante algum tempo, ele foi o artista musical de maior bilheteria. Eis uma informação de fato surpreendente. Apenas porque não se fala mais de Leon Russel.
Para além dos sucessos, ele produziu Bob Dylan, foi uma estrela de fato gigante no Concert For Bangladesh organizado por George Harrison em 1971, e foi o tipo de compositor cujas canções como A Song For You foram gravadas por alguns dos maiores nomes daquele tempo, em todos os gêneros musicais.
O auge de Russell é coisa bem contada nas várias histórias espalhadas por diversos livros e documentários acerca daqueles tempos loucos que mudaram a face do mundo. Mas nunca houve uma biografia detalhada de sua carreira.
Bill Janovitz, escritor, músico e membro do Buffalo Tom, conta em Leon Russell: The Master of Space and Time’s Journey Through Rock & Roll History (Hachette, 2023) a história do artista crescendo em Oklahoma nos anos 1940 e 50, tocando nos clubes de Tulsa quando adolescente, antes de se mudar para Los Angeles, para bem depois se estabelecer como artista solo.
Naqueles clubes no final dos anos 1950, Russell formou amizades musicais que ajudaram a desenvolver o chamado Tulsa Sound — espécie de estilo que reuniu uma mistura de sons de blues, blues rock, country, rock’n roll e pop do período. Janovitz dedica o livro ao lendário baterista da “galera”: Jimmy Karstein.
Durante seu tempo em Los Angeles, como membro do lendário grupo de músicos de estúdio conhecido como The Wrecking Crew, Russell tocou com figuras como Frank Sinatra e Phil Spector, passando pelos Beach Boys e inúmeros outros.
O biógrafo capta bem o espírito da época. A carreira solo de Russell surgiu lentamente, mas seu estilo foi baseado em suas experiências musicais que foram vivenciadas naquele tempo.
Russell montou uma das turnês lendárias do início dos anos 1970, quando reuniu a banda Mad Dogs and Englishmen para acompanhar Joe Cocker, que desembarcara sem tostão na América, numa autêntica trip “with a little help from my friends”. Janovitz explica como essa turnê realmente ajudou a carreira de Russell mais do que a de Cocker. Ainda a fundamental amizade com Willie Nelson, que ajudou o povo hippie da contracultura a voltar suas antenas para a música country tradicional, o que resultaria anos depois na influência explícita do gênero em discos dos Rolling Stones como Let it Bleed e Exile on Main Street, por exemplo. Além, é claro, de sua “performance” como o personagem Hank Wilson, no disco Hank Wilson’s Back (1973).
Leon Russell também inovou quando o assunto era business, e em diversos aspectos técnicos. Numa época em que a guitarra elétrica imperava, ele mostrou o que um piano podia fazer como instrumento principal, inspirando futuras estrelas como Elton John.
Com Denny Cordell, Russel fundou a Shelter Records, que foi uma das primeiras gravadoras tocadas por artistas que resultaram em alguma grana e trabalhos consistentes. Trouxe J. J. Cale, fez ressurgir Freddie King e transformou Tom Petty em artista influente.
Sua casa em Skyhill Drive foi dos primeiros home studios da história. Ele foi fundamental na popularização dos sintetizadores, sendo um dos primeiros a adotar o Chamberlin, que foi o precursor do mais conhecido Mellotron. Pensou no conceito da bateria eletrônica programável que Roger Linn incorporou ao inovador Linn LM-1.
Na segunda metade dos anos 1970, Russell montou sua própria produtora de vídeo, pois acreditava que o audiovisual seria uma parte fundamental do futuro da música, antes das grandes gravadoras.
O extravagante astro do rock do início dos anos 1970 era em verdade um sujeito tímido, e sua aversão pela mídia e as intermináveis turnês — que a indústria sempre impôs — contribuíram para sua pouca popularidade nas décadas que se seguiram.
Leon Russell era branco, de Oklahoma, com um pé imenso no country, e por natureza repleto de fãs do sul dos EUA. Casou-se com uma mulher negra, a cantora Shelter Mary McCreary. Lançou um álbum com ela: Wedding Album (1976). Um disco que o levou a sofrer ataques racistas, pelo casamento misto. Um “clássico” comportamento no sul dos EUA.
Quando o casal se divorciou no final dos anos 1970, tudo coincidiu com a queda de sua arrecadação como artista. Após grande investimento na novidade do estúdio de vídeo, sua Paradise Records rompeu (ou foi rompida) com a Warner já no início dos anos 1980. Isso levou Russell a se tornar um artista independente baseado em Nashville.
Ele se tornou uma espécie de ermitão recluso, então. Gravou depois disso seus últimos dois álbuns por grandes gravadoras: The Union (2010, com Elton John) e Life Journey (2014). Fez diversos trabalhos em conjunto. Até tocou no Brasil com Edgard Winter em 1987.
Leon Russell – The Master of Space and Time’s Journey Through Rock & Roll History faz uma espécie de acerto de contas históricas da longa carreira de Russell no mundo da música, mas também olha para o personagem como pessoa, e a todos que tiverem a chance de ler o livro. Ainda sem tradução no Brasil, a leitura é obrigatória para todos os fãs.
Artista fundamental para a indústria da música como um todo, Leon Russell só poderia mesmo ter surgido nas entranhas dos estúdios, e antes ainda, nas profundezas dos clubes empoeirados de sua terra natal.
Uma referência sem igual na história do rock’n roll.
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Leon Russell: The Master of Space and Time’s Journey Through Rock & Roll History – Amazon
Americana – Leon Russell (1978)