Revista marcou toda geração que foi jovem nos 1970’s. Editada pela Abril, trazia novidades da música e assuntos de interesse como virgindade, surfe e viagens
Quando adentrou a década de 1970, a Editora Abril já tinha a classe média em suas mãos, com as bem-sucedidas edições de Veja e Realidade, revistas que ajudaram a cristalizar o imaginário dessa mesma classe média como “formadora de opinião”. O que de fato aconteceu.
Dentro do universo editorial, sejam literárias ou dedicadas ao jornalismo, havia publicações dedicadas ao público infantil (os gibis e almanaques, especialmente) e ao público adulto. Mas muito pouco era voltado ao público jovem. Mesmo após uma década marcada pela Jovem Guarda, que teve seu próprio programa na tevê, além de dezenas de genéricos em emissoras locais país afora, bem como já despontavam programas de rádio que tocavam a música rock, preferência máxima da juventude à época, nas bancas de jornal muito pouco ou nada havia para a faixa etária de 15 a 25 anos.
Das mesas diretoras do prédio da Abril no bairro de Pinheiros, em São Paulo, partiu diretamente de Victor Civita — muito provavelmente convencido por sua equipe — a ordem para que um periódico voltado ao universo juvenil fosse criado e viesse à tona. Assim, foi às bancas em novembro de 1972 a revista Geração Pop.
Na capa do número um, um casal jovem trajando jaquetas e calças blue jeans com adereços coloridos, a garota montada às costas do rapaz, e as diversas chamadas para matérias sobre B.J. Thomas, viagens para a Bahia, a mania das motocicletas, a “música que a gente curte”. De brinde, um pôster de Chico Buarque, que acabara de retornar de seu exílio na Itália e lançara o icônico álbum Construção.
O primeiro editorial não poderia ser mais direto: “Este é o primeiro número da primeira revista da nossa idade. Feita especialmente para você, jovem de quinze a vinte e poucos anos. Com coisas do seu interesse, que, além de informar e divertir, também sejam úteis. Indicações para você comprar as últimas novidades em discos, livros, aparelhos de som e fotografia, máquinas e motocas, roupas incrementadíssimas. Orientação na escolha de uma profissão, reportagens sobre assuntos da atualidade. E muita música, claro. Veja a revista. Depois, escreva para a gente. Nós queremos saber o que você achou”.
A Geração Pop (chamada desde sempre apenas “Pop”, devido à logomarca) ia às bancas mensalmente. Transformou-se em uma verdadeira febre. A caixa postal da editora recebia cartas de norte a sul, numa proporção muito maior que todo o repertório da Abril. Estava lançada a pedra fundamental do jornalismo de cultura pop no país. Para além da música, esportes radicais, carros, motos, viagens e moda, assuntos ainda tabu passaram a frequentar a pauta da revista. Sexo, comportamento, relacionamento com os pais, conflitos, carreira e profissões.
A jornalista e escritora Ana Maria Bahiana, figura principal da revista, revelou em seu livro Almanaque Anos 70 de 2006: “Era uma interpretação organizada, sanitizada e comercialmente estruturada do boom de títulos alternativos que dominaram o início dos 70, com matérias de moda, esporte, viagem, comportamento, saúde (‘masturbação faz mal?’) e beleza, além, é claro, de música. Tinha um foco bem marcado em cima do que era ‘por dentro’ e ‘por fora’, com uma perspectiva de consumo”.
Uma vez estabelecida, a Pop ajudou também a revelar a primeira “nata” do jornalismo cultural jovem brasileiro. Entre seus colaboradores estavam Ezequiel Neves, Leon Cakoff, Caio Fernando Abreu, Pinky Wainer, Júlio Barroso, Caco Barcelos, Alberto Carlos de Carvalho, Okky de Souza, Valdir Zwetsch e José Emílio Rondeau”.
Entre 1972 e 1979, tratou desde o Pink Floyd até a febre da disco music. Deu luz sobre esportes ainda incipientes como o surfe, skate, motocross, paraquedismo e montanhismo. Achou brecha para falar de sexo e comportamento juvenil. Apresentou centenas de álbuns hoje clássicos da música mundial. Estabeleceu uma nova crítica musical através de seu suplemento interno HitPop.
Entrou em decadência no final dos 70’s. Muitos creditam o fato a uma reportagem fajuta sobre o movimento punk, publicada em 1977, que nunca mais recuperou o prestígio da revista, ficando mais próxima em sua fase derradeira a uma espécie de “Capricho para jovens”, com conteúdo água-com-açúcar.
De toda forma, o disco que veio encartado na tal edição da reportagem — uma coletânea com diversos grupos chamada “Revista Pop Apresenta o Punk Rock” — ajudou a moldar o movimento no Brasil, e o surgimento de diversas bandas do gênero a partir de então. De Inocentes a Ratos de Porão, todos foram influenciados pela coletânea.
A Pop deixou muito mais que lembranças. Na esteira, após sua dissolução, vieram a Somtrês, a Roll, a Bizz e a edição definitiva da Rolling Stone Brasil (a primeira foi malfadada e pirata, em 1971). Pergunte a seus pais. Deve haver alguma edição dentro do guarda-roupas ou na garagem, ainda.
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Imagens: reprodução
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