Clássico de Russ Meyer lançado em 1965 choca pela natureza violenta, mas encanta pela riqueza de imagens, sons e sentidos
Três go-go girls partem em seus carros esportivos de corrida para alguns dias de aventura, exalando violência e sedução. A trupe é liderada por Varla (Tura Satana), uma mestiça nipo-americana carateca, cuja amante lésbica, Rosie (Haji), é uma espécie de escrava submissa. A terceira mulher, Billie (Lori Williams), encara a viagem de forma relutante, e é a única que possui qualidades “edificantes”.
Após uma briga em um lago, as mulheres desafiam um jovem casal, Tommy (Ray Barlow) e Linda (Susan Bernard), para um “pega” em seus carrões. Varla vence trapaceando, deixando Tommy contrariado. Ela quebra suas costas com um golpe de caratê. Horrorizada, Linda desmaia em choque.
Deixando o corpo de Tommy para trás, as mulheres tomam Linda como refém e dirigem até um posto de gasolina administrado por um velho confinado (Stuart Lancaster) a uma cadeira de rodas e seu filho musculoso e estúpido, chamado simplesmente de Vegetal (Dennis Busch). Ao saber que o velho tem um dinheiro escondido em algum lugar, as mulheres decidem encontrar um meio de colocar as mãos nele. Enquanto Varla e Rosie continuam bisbilhotando — e fazendo amor — Billie decide seduzir Vegetal e é ajudada pelo velho voyeurista safado, que encoraja seu filho a estuprar a garota.
Os eventos chegam ao clímax com a chegada de Kirk (Paul Trinka), o outro filho do velho, que fica por perto zelando pelo irmão. Varla tenta seduzi-lo para saber onde está escondido o dinheiro. Kirk é forçado a lutar contra Varla como se estivesse lutando contra um homem. Todas as cenas se dão ao som de um jazz estupidamente nervoso.
Este é mais ou menos aquilo que podemos chamar de o “teatro de guerra” onde se desenvolve a trama de Faster, Pussycat! Kill! Kill! (Mais rápido, gatinha! Mate! Mate!), filme meio sexpoitation meio road movie, com doses cavalares de violência gratuita, velocidade e mulheres fatais, dirigido por Russ Meyer em 1965.
Russell Albion Meyer nasceu em Oakland na Califórnia, em 1922. Foi diretor, produtor, roteirista, diretor de fotografia e editor. Tornou-se conhecido principalmente por escrever e dirigir uma série de filmes “curtos e grossos” de sexploitation de sucesso que apresentam humor exagerado, sátira e mulheres peitudas, como este Faster, Pussycat! Kill! Kill! .
Meyer foi apelidado de “King Leer” (algo como “rei malícia” em tradução pobre e livre, sacaneando obviamente o Rei Lear de Shakespeare). Mais um maluco nato da baía de Oakland — na mesma Califórnia onde nasceram os Hell’s Angels entre outras aberrações sociopatas. Trabalhou como cinegrafista no teatro europeu durante a Segunda Guerra Mundial, tornou-se um dos primeiros fotógrafos da Playboy e criou Mudhoney, Motor Psycho e Beyond the Valley of the Dolls, além de mais de duas dezenas de filmes bizarros. Russ Meyer também gostava de carros potentes, era fetichista e tirem suas próprias conclusões. Meyer costumava descrever Beyond the Valley of the Dolls (1970) como seu trabalho definitivo. Morreu em Los Angeles, 2004, aos 82 anos.
Faster, Pussycat! Kill! Kill! é provavelmente seu trabalho mais conhecido. É também inspiração para nomes como Quentin Tarantino. A abertura é icônica. Uma narração beatnik ao som de jazz e linhas brancas animadas que se movem com a voz do narrador: “senhoras e senhores, bem-vindos à violência, à palavra e ao ato! (…)”. A ação evolui para uma mistura de cenas de três mulheres dançando enquanto homens estupefatos gritam “go! go!” . Um filme nada sutil. Cafona na medida, violento sem motivo aparente, com tudo que pode haver de ridículo, o que o torna genial. Marcante.
A quem já teve a oportunidade de assistir ao filme na companhia de homens heteros, é impossível não reparar no desconforto causado. Algo como “imagine que enrascada não seria encontrar três malucas psicopatas como estas em uma parada na estrada no meio de um deserto?”. Chega a dar pena.
Mais que isso, o filme se dá especialmente acerca de um elemento que (pelo menos ainda nos 1960’s) era de “propriedade” quase exclusiva do universo masculino: os carros. Pois pensamos na forma como boa parte da coisa toda se dá: desde o Porsche 356 até o velho pederasta empunhando uma espingarda em uma cadeira para deficientes, estamos “sobre rodas”! No meio do deserto, sem os valores impostos pela sociedade para definir as regras de conduta, como em um faroeste. As garotas deitam e rolam.
O velho, ante as três selvagens: “Mulheres! Eles as deixam votar, fumar e dirigir — até mesmo usar calças compridas! E o que acontece? Um democrata para presidente!”.
Faster Pussycat! Kill! Kill! é um clássico repleto de imagens, sons e sentidos. Disponível, legendado, e muito fácil de entender o recado.
Não se meta com aquelas gurias.
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Faster, Pussycat Kill Kill (1965) – completo e legendado
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Imagens: reprodução