De onde vem o termo Fringe?


Nome da mostra paralela do Festival de Curitiba tem origem na Escócia, onde até hoje ocorre o maior festival artístico do mundo

Corria o final do ano de 1945 quando um empresário refugiado da Alemanha nazista chamado Rudolf Bing entendeu que seria bacana criar um festival internacional em pleno Reino Unido. A partir de diversas pesquisas, Edimburgo foi a cidade proposta por um amigo seu, sir Henry Harvey Wood, do Conselho Britânico, e apoiado por sir John Falconer e lady Rosebery, reitor e professora na capital escocesa.

Ainda em 1945 foi formado um comitê do festival que decidiu que 1947 seria a data mais próxima possível — e que o evento seria uma chance para Edimburgo criar uma nova identidade pós-guerra como uma espécie de “resort cultural da Europa”.

O primeiro Festival Internacional de Edimburgo começou em 24 de agosto de 1947, com o objetivo de “fornecer uma plataforma para o florescimento do espírito humano”, reunindo pessoas e artistas de todo o mundo. Um dos destaques da programação do primeiro ano foi o reencontro do maestro Bruno Walter com a Filarmônica de Viena. Um tanto germânico, não? É que havia um esforço de reerguer os países derrotados no conflito recém-terminado, então sob domínio dos aliados, em uma tentativa de apagar os rancores da Segunda Guerra.

Acontece que, não mais que de repente, oito companhias — seis escocesas e duas inglesas — apareceram sem convite em Edimburgo. Do nada, realizaram seus próprios espetáculos. A saber, foram o Glasgow Unity Theatre, Christine Orr Players of Edinburgh, Edinburgh People’s Theatre, Edinburgh District Community Drama Association, Pilgrim Players, Edinburgh College of Art Theatre Group e a Manchester Marionette Theatre. Esses grupos funcionavam de forma totalmente independente, algo próximo do que conhecemos como mambembe, sem nenhuma estrutura de apoio.

Nada demais, mas os grupos chamaram a atenção do público, e passaram eles próprios a se denominar “Festival Adjunto”. Pelo público, e pela organização — que não se opunha — também eram chamados de festival “semioficial”. Já em 1948 Robert Kemp, um jornalista e dramaturgo escocês, descreveu a situação: “à volta da mostra oficial do Festival, parece haver mais iniciativa privada!”.

Não se sabe como surgiu, mas parece óbvio: a palavra “fringe” foi adotada por significar literalmente “franja”, “borda”, “margem”, determinando algo que está “ao redor”, que “corre por fora”.  E desde suas origens em Edimburgo tornou-se um termo universal para um certo tipo de experiência artística.

A jovem princesa Elizabeth estava presente quando sir Thomas Beecham regeu uma série de orquestras reunidas durante o final do Festival em 1948. Também esteve presente o produtor de cinema de Hollywood Mike Todd, que fez um documentário que chamou a atenção do público internacional para o espetáculo de encerramento.

Em 1960, ocorreu um espetáculo chamado Beyond the Fringe no Lyceum Theatre em Edimburgo, que prefigurou o satire boom (explosão da comédia) da década de adentrava, quebrando muitas das convenções da época e é considerado o precursor dos programas de televisão britânicos que viriam, como That Was the Week That Was, At Last the 1948 Show e o principal e mais destacado de todos, o Monty Python’s Flying Circus. O espetáculo era estrelado por Peter Cook, Dudley Moore, Alan Bennett e Jonathan Miller.

A partir de 1958, o Festival Fringe Society foi criado em resposta ao sucesso dessa tendência crescente. A sociedade formalizou a existência deste coletivo de espetáculos, forneceu informações aos artistas, divulgou o programa Fringe e criou uma bilheteria própria. Até hoje essa política permanece no centro do festival, e a cidade tem orgulho de incluir em seu programa qualquer pessoa com uma história para contar e um local disposto a recebê-la.

O Festival de Teatro de Curitiba nasceu em 1992, idealizado por Leandro Knoplholz e Carlos Eduardo Bittencourt, dois “piás” com 18 e 22 anos respectivamente à época.  Em sua primeira edição, a Ópera de Arame foi palco de Sonhos de Uma Noite de Verão, de William Shakespeare, sob direção de Cacá Rosset. Ainda nesta primeira edição o festival contou com espetáculos de  Antunes Filho, Gerald Thomas e Zé Celso Martinez Corrêa.

A partir de 1998 o Festival de Teatro de Curitiba importou a ideia de ter seu próprio Fringe — um espaço aberto, democrático e sem curadoria. O Fringe já revelou dezenas de grupos de sucesso até hoje em atividade no país, com destaque para os curitibanos da Sutil Companhia do diretor Felipe Hirsch e o ator, diretor e produtor Guilherme Weber. Essa mostra paralela apresenta centenas de espetáculos de vários gêneros em diversos espaços culturais de Curitiba, a cada edição do festival.

Confira a programação do Fringe deste ano no site www.festivaldecuritiba.com.br.

Ouça. Leia. Assista:

The Edinburgh Festival Fringe

Imagens: reprodução